quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Fuga

Para Emily



Eu estava com a barba postiça
De Dostoievski
E segurava a antiga bolsa
Que herdei do meu pai

Ela chegou logo em seguida
Um chapéu excêntrico
E vestes Belle epóque

Não estávamos tão discretos
O quanto gostaríamos
Mas não fazia diferença...
Realmente éramos diferentes
Dos demais passantes.

Pronta para a fuga, Baby?
Trazia uma mala que mal conseguia carregar
Fui ajudá-la

Cuidando estranho o peso,
Tomei a liberdade de espiar...
Livros, manuscritos e cadernos...

E as tuas roupas, Baby?
Não couberam por causa dos livros – Ela disse
Enternecido, falei:
Ah, é por isso que te amo!

E nos unimos num abraço longo e silencioso
Num dístico despojado & amoroso

Eu levava roupas elementares
Rimbaud e meu violão

Tudo certo!
Nosso destino?
Um país longínquo e frio
Sem carnaval

Tudo certo
Nosso destino?
A louca aventura
De viver o amor
Em fuga

Obscuridade

Essa poesia botada fora
Esse sono sem esplendor
Esse verso que se insinua
Vida a ser redigida
Sem dia marcado

Esse silêncio unânime
Esse dínamo amortecido
Esse solfejar curvado
Este escrever amarrotado
Num riacho turvo

Esse não ser Rimbaud
Esse não ser Homero
Esse ser sem rosto
Porvir que não vem
Só um cansaço cinza

Esse não ser Verlaine
Esse costume epígono
Contraversão
Da luz e da energia

E a sala de máscaras
Todas com pó e umidade
Esse deixar-se obscuro
Esse mostrar-se nu
Dentro de uma gaveta

Lamento como adágio
Dia a dia: planos que morrem
Em doses de tédio e traças
Ser-se eterno ser obsoleto
Esquecido num caderno

O Sortilégio não vem
A cura - a calma não chega
É hora de queimar tudo Versos –
Projetos abjetos Inclusive o poeta