Blog da autoria de Leonardo Alves. São poemas, contos, crônicas, rabiscos de gênero inclassificável. Além de pretenso escritor, Leonardo também é fabricante de nuvens e nas horas de folga compõe canções obscuras.
quinta-feira, 27 de março de 2014
terça-feira, 4 de março de 2014
Pouso
Para Vanessa Regina
Há tanto mar nas tuas lágrimas
Tanto amor nos teus olhos de cristal lúcido
Tanto amor na seiva dos meus braços
E dor na breve necessidade da ausência
Mas há também um porto
Um pouso, um farol
Uma vida à parte
Para descansarmos
Há tanta profundidade nas tuas noites
Tanto questionar-se, tanto frêmito
E há um medo no meu peito frágil
Inquietação, receio indefinido.
Mas há, acima de tudo
O amor, uma resposta
Que se desenha no teto
Na simpleza do gesto
Imensurável
Enfim, o definitivo encontro
A paz afinal
Sinalizando renovados dias
Revoada de versos.
quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014
Fuga
Para Emily
Eu
estava com a barba postiça
De
Dostoievski
E
segurava a antiga bolsa
Que
herdei do meu pai
Ela
chegou logo em seguida
Um
chapéu excêntrico
E vestes
Belle epóque
Não
estávamos tão discretos
O quanto
gostaríamos
Mas não
fazia diferença...
Realmente
éramos diferentes
Dos
demais passantes.
Pronta
para a fuga, Baby?
Trazia
uma mala que mal conseguia carregar
Fui
ajudá-la
Cuidando
estranho o peso,
Tomei a
liberdade de espiar...
Livros,
manuscritos e cadernos...
E as
tuas roupas, Baby?
Não
couberam por causa dos livros – Ela disse
Enternecido,
falei:
Ah, é
por isso que te amo!
E nos unimos
num abraço longo e silencioso
Num
dístico despojado & amoroso
Eu
levava roupas elementares
Rimbaud
e meu violão
Tudo
certo!
Nosso
destino?
Um país longínquo
e frio
Sem
carnaval
Tudo
certo
Nosso
destino?
A louca
aventura
De viver
o amor
Em fuga
Obscuridade
Essa
poesia botada fora
Esse
sono sem esplendor
Esse
verso que se insinua
Vida
a ser redigida
Sem
dia marcado
Esse
silêncio unânime
Esse
dínamo amortecido
Esse
solfejar curvado
Este
escrever amarrotado
Num
riacho turvo
Esse
não ser Rimbaud
Esse
não ser Homero
Esse
ser sem rosto
Porvir
que não vem
Só
um cansaço cinza
Esse
não ser Verlaine
Esse
costume epígono
Contraversão
Da
luz e da energia
E
a sala de máscaras
Todas
com pó e umidade
Esse
deixar-se obscuro
Esse
mostrar-se nu
Dentro
de uma gaveta
Lamento
como adágio
Dia
a dia: planos que morrem
Em
doses de tédio e traças
Ser-se
eterno ser obsoleto
Esquecido
num caderno
O Sortilégio não vem
A cura - a calma não chega
É hora de queimar tudo Versos –
Projetos abjetos Inclusive o poeta
domingo, 19 de janeiro de 2014
Poema para Emily nº 2
1
Ela
encontrou minhas cartas de suicida
Antes
que eu me jogasse no mar-evasão
Em
definitivo
E
me apresentou sua lira fulgente
Diamantes
que brilharam para meus olhos
E
para minha alma de estanho estilhaçado
Emily
me ofertou um novo coração
Deu-me
visões - alusões
Um
jeito de ser - novamente
Um
sorrir que estava aprisionado
Em
fotos da década passada
Emily
é um espelho
E
nos vemos
E
nos confundimos
Confluímos
Sonho
concreto para repousar
Olor
de vida palpitante
Emily
sempre
Com
as mãos cheias de versos
Ideogramas
E
sentimentos
E
com seus beijos labirínticos
Sua
inteligência seu humor
Consegue
emudecer o tempo
Para
nós dois...
2
Descobrimos
que somos
Da
mesma substância rara
Feitos
de silêncio cálido
E
olhares para o infinito
Somos
duas montanhas
Assinalando
a imensidão
Juntos,
de mãos dadas
Caminhando
ao pôr do sol
Mesmo
que não haja sol.
segunda-feira, 13 de janeiro de 2014
Poema para Emily
Quando te conheci
Não foi te conhecer
Foi te reencontrar...
Eras o meu sonho:
A menina
Abraçada em um livro de
poemas
Seu olhar tímido
E, ao mesmo tempo, intenso.
Um momento mágico
Daqueles que se espera
No mínimo 35 anos para
acontecer:
A menina
E seu livro de poemas!
Há tu, que me encontraste
Através de poemas sonâmbulos
Cheios de solitude!
Quem diria, que irias me dar
o impossível
Um sorriso!
Fomos ver o mar
Mas havia algo maior que o
mar
Surgindo entre nós
Tu perdoaste meus clichês nervosos
Eu te dei Cecília e uma
dedicatória!
Eras o meu sonho realizado:
Uma menina
Com poesia no olhar, na pele,
nos lábios
Eu já não sabia brigar com a
vida...
Conversamos, conversamos
Até o entardecer
O barulho motorizado da
cidade
Uma TV abjeta
Não nos incomodou
Nos fez rir
E entre sorrisos e beijos.
Por fim nos abraçamos em
silêncio
E entre teus braços e o silêncio
Me descobri em ti
Percebi que minha vida
Havia mudado naquele
instante...
sábado, 11 de janeiro de 2014
Rascunhos do Caderno B (mais uma folha maldita)
1. Faz um calor proveniente das
fornalhas do inferno. Mas sinto frio. Muito frio. E medo. Não o medo de estar
enfermo, com febre. Não o medo pálido da morte. Somente o medo dessa ausência
de mim, ente sem biografia cada vez mais dissipado. Sem utilidade prática.
2. Recitei teus poemas em voz
alta como se estivesse rezando. Na esperança de ressuscitar a borboleta morta
no peitoril da janela. Perdi mais que o sono. Não sinto gosto de nada. Nada.
3. Esculpi num ímpeto de
Pigmalião toda tua essência. Ficaste invisivelmente linda. Mas teu corpo... Não
consigo, não posso. Teu corpo se evapora da minha mente antes que eu pense em
esculpi-lo. Teu corpo é longes e sem fim. E sem mim.
4. Amo dormir, pois o sono é uma
amostra sutil da morte; por isso a morte não me causa espanto. Por isso
adormecer tanto me apraz. O descansar de toda minha lástima - que é anedota
para o mundo prático & eficiente. Entretanto
perdi o sono. Quando se perde o sono, é possível ver todas as fendas do absurdo
de persistir. O livro de sonhos entreaberto, não lido, aborrecido nas cobertas
reviradas. A vida entreaberta, não lida revirada, mal vivida.
5. Confesso, sem pejos, que
desisti das Elegias de Duíno. Escrevo minhas próprias elegias. Leio
parcialmente Nietzsche e Sartre, com o ânimo desbundado. Acrescento um pouco de
ulcerações. E a oficina do poeta é um improviso de madeiras velhas e
infiltrações no teto, nas paredes e na ambição de beleza.
6. Enchi de explosivos minha
sorte; sabotei minha felicidade. Herdei o olhar medroso do meu pai. Meu plano
sempre foi ser uma fortaleza. Mas vou me desconstruindo. Tenho areia no rosto
dos chutes que levei sorrindo/envergonhado. Estou magro, pálido, com fundilhos
caídos no infinito.
7. Minha maldita metralhadora às
vezes dispara no alvo errado. São palavras impossíveis de apagar. O
arrependimento rasga meu peito. O espelho se envergonha de mim. Qualquer escusa
vale menos que uma moeda de um centavo. Não peço desculpas. Perco a batalha. E
cada vez mais, perco o amor.
8. O poeta é bem mais que um
fingidor! É uma fraude!Um ser cheio de lacunas que caga e mija no vazio. O
poeta é um carregador de verduras; estivador de mãos frágeis. Sem aptidões.
sábado, 4 de janeiro de 2014
Elegia I (apontamento)
Ah! se eu chamasse por Deus
Quem viria em seu lugar
Sorver meu sangue e inocência?
Ah, se eu clamasse por anjos
Que legião astuta viria me
fazer rezar
Com a renúncia estéril de um anacoreta?
Desesperado, cavei com mãos
vazias
A minha cova...
Unhas partidas, o sangue
brotando
Misturando-se à terra suja
Já sem digitais, a carne
vívida
Rosto de uma semana insone
Olhei para o fosso aberto
E vi que eu não cabia ali
Mãos covardes demais para
tecer
Minha própria morte
Certo apego em forma confusa
De flagelo & frágil
espera
A beleza também não se
revelaria
Se eu pranteasse por outros ardis
simbólicos
Era preciso superar
O eu dentro da fantasia de
palha
O eu dentro do fantasma de
medo
Superar
Toda a irrisão
E desentranhar
Um olhar fortalecido
Do labirinto de tomos
Cavei um buraco no céu
Para ver o que havia além do
céu
Encontrei astros boiando a
esmo
Em vias de lactescências
Sem vestes celestiais
Encontrei a mim mesmo
No desespero brando
Da solidão.
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